Decisão TJSC

Processo: 5075707-69.2025.8.24.0000

Recurso: Agravo

Relator: Desembargadora SORAYA NUNES LINS

Órgão julgador:

Data do julgamento: 19 de dezembro de 2006

Ementa

AGRAVO – Documento:6980320 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5075707-69.2025.8.24.0000/SC RELATORA: Desembargadora SORAYA NUNES LINS RELATÓRIO Cuida-se de agravo de instrumento interposto por Tuna Pagamentos Ltda. contra decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da comarca da Capital, em autos de ação de declaratória de nulidade de cláusulas contratuais e indenização por perdas e danos ajuizada por Seazone Serviços Ltda. e Khanto Reservas Ltda., assim redigida: KHANTO RESERVAS LTDA e SEAZONE SERVICOS LTDA, ajuizaram a presente "ação declaratória de nulidade de cláusulas contratuais e indenizatória por perdas e danos" em desfavor de TUNA PAGAMENTOS LTDA, estando ambas partes qualificadas, alegando retenção indevida de valores oriundos de “chargebacks” e transferência abusiva do risco da atividade da ré às autoras.

(TJSC; Processo nº 5075707-69.2025.8.24.0000; Recurso: Agravo; Relator: Desembargadora SORAYA NUNES LINS; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)

Texto completo da decisão

Documento:6980320 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5075707-69.2025.8.24.0000/SC RELATORA: Desembargadora SORAYA NUNES LINS RELATÓRIO Cuida-se de agravo de instrumento interposto por Tuna Pagamentos Ltda. contra decisão proferida pelo Juízo da 1ª Vara Cível da comarca da Capital, em autos de ação de declaratória de nulidade de cláusulas contratuais e indenização por perdas e danos ajuizada por Seazone Serviços Ltda. e Khanto Reservas Ltda., assim redigida: KHANTO RESERVAS LTDA e SEAZONE SERVICOS LTDA, ajuizaram a presente "ação declaratória de nulidade de cláusulas contratuais e indenizatória por perdas e danos" em desfavor de TUNA PAGAMENTOS LTDA, estando ambas partes qualificadas, alegando retenção indevida de valores oriundos de “chargebacks” e transferência abusiva do risco da atividade da ré às autoras. Aduziram que a instituição de pagamento, apesar de intermediar os pagamentos de reservas de hospedagem feitas pelos hóspedes das autoras, reteve/estornou valores mesmo após a efetiva prestação do serviço, contabilizando 97 (noventa e sete) chargebacks que totalizam R$ 203.881,72 (histórico) e, em 96 casos, os estornos foram remetidos à análise das emissoras de cartão, com prazo de até 180 dias, o que lhes causa severo desfalque de caixa. Apontaram, como abusivas, a Cláusula C, item 3, “d” (“Risco de Fraude”) e a Cláusula D, item 7, “d” (“Declarações e Garantias”) do contrato de adesão, por impor responsabilidade exclusiva ao estabelecimento e retirar a ré da disputa com o cliente, além de permitir retenções unilaterais. Juntaram planilha com a discriminação dos 97 chargebacks (com valores, datas, imóveis e status), prints do dashboard da ré e amostras de defesas/contatos que, segundo afirmam, demonstram a efetiva ocupação dos imóveis pelos hóspedes. Afirmaram, em síntese, que: (i) as transações são processadas exclusivamente pela ré, que detém os dados sensíveis e as ferramentas antifraude; (ii) os chargebacks versam, majoritariamente, sobre supostas compras não reconhecidas, conquanto os imóveis tenham sido efetivamente ocupados; (iii) houve ao menos um caso em que a própria ré reconheceu “bug” sistêmico que inviabilizou a contestação tempestiva; (iv) a cláusula que atribui às autoras, com exclusividade, as perdas por fraude e contestações e autoriza descontos/compensações automáticos é abusiva, por sujeitar a relação ao puro arbítrio da ré e desvirtuar a alocação dos riscos; (v) o bloqueio prolongado (até 180 dias) compromete o fluxo de caixa das autoras, que já repassaram valores a proprietários e suportam os custos da operação. Por fim, requereram, em tutela de urgência: (a) a liberação imediata de R$ 203.881,72 (97 chargebacks); subsidiariamente, (b) a liberação de R$ 203.456,72 (96 casos remetidos à análise das emissoras); e (c) que a ré se abstenha de realizar novos bloqueios/retenções a título de chargeback, tudo sob pena de multa diária a ser fixada. É o relatório. Decido. Para concessão da tutela de urgência requerida, faz-se necessária a conjugação dos requisitos ínsitos no art. 300 do CPC, quais sejam, a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, que se traduzem nos já consagrados requisitos conhecidos pelas expressões latinas fumus boni iuris e periculum in mora. Nas palavras de Fredie Didier Jr.: “A probabilidade do direito a ser provisoriamente satisfeito/realizado ou acautelado é a plausibilidade de existência desse mesmo direito. (...) O segundo requisito – talvez o mais importante, uma vez que integra a própria essência da tutela de urgência –, é o de perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo" (DIDIER JR., Fredie. Curso de Direito Processual Civil. 2015, p. 608. ) Acerca da legalidade da cláusula de chargeback e da responsabilização exclusiva do lojista em caso de contestação, já se posicionou o Superior que, comprovada a regularidade da transação e não havendo negligência por parte do lojista, indevida a retenção de valores por parte da instituição e pagamento. DIREITO COMERCIAL. APELAÇÃO CÍVEL. CONTRATO DE PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS DE PAGAMENTO. CHARGEBACK. CLÁUSULAS ABUSIVAS. ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME TRATA-SE DE AÇÃO AJUIZADA POR MICROEMPREENDEDORA INDIVIDUAL EM FACE DE INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO, VISANDO À DECLARAÇÃO DE NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS RELATIVAS AO CHARGEBACK E À RESTITUIÇÃO DE VALORES RETIDOS EM RAZÃO DE ESTORNOS DE TRANSAÇÕES COMERCIAIS. A SENTENÇA DE PRIMEIRO GRAU JULGOU PARCIALMENTE PROCEDENTES OS PEDIDOS, DECLARANDO A NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS E CONDENANDO A RÉ À RESTITUIÇÃO DE VALORES. [...] 3. É APLICÁVEL O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR À HIPÓTESE, DIANTE DA HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA, JURÍDICA E ECONÔMICA DA AUTORA FRENTE À INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO, NOS TERMOS DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ. AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS QUE IMPÕEM AO LOJISTA A RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA POR PREJUÍZOS DECORRENTES DE CHARGEBACKS SÃO ABUSIVAS, POR TRANSFERIREM O RISCO DA ATIVIDADE EMPRESARIAL À PARTE MAIS VULNERÁVEL, CONTRARIANDO O ART. 122 DO CÓDIGO CIVIL E OS PRINCÍPIOS DO CDC. A AUTORA COMPROVOU A REGULARIDADE DAS TRANSAÇÕES E A ENTREGA DOS PRODUTOS, NÃO HAVENDO DEMONSTRAÇÃO DE NEGLIGÊNCIA QUE JUSTIFICASSE A RETENÇÃO DOS VALORES. [...] TESE DE JULGAMENTO: "1. É APLICÁVEL O CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR À RELAÇÃO CONTRATUAL ENTRE MICROEMPREENDEDOR INDIVIDUAL E INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO, QUANDO EVIDENCIADA A HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA, JURÍDICA OU ECONÔMICA. SÃO ABUSIVAS AS CLÁUSULAS CONTRATUAIS QUE TRANSFEREM AO LOJISTA A RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA POR PREJUÍZOS DECORRENTES DE CHARGEBACKS, CONFIGURANDO DESEQUILÍBRIO CONTRATUAL. A PARTE QUE DECAI DE PARTE MÍNIMA DO PEDIDO NÃO DEVE ARCAR COM OS ÔNUS DA SUCUMBÊNCIA, NOS TERMOS DO ART. 86, PARÁGRAFO ÚNICO, DO CPC." (TJSC, Apelação n. 5032198-08.2024.8.24.0038, do , rel. Rodolfo Tridapalli, Terceira Câmara de Direito Comercial, j. 26-06-2025). No caso em tela, a probabilidade do direito, neste momento cognitivo sumário, está suficientemente evidenciada por: (i) extensa amostra probatória de que, em inúmeros casos, houve check-in/ocupação dos imóveis por parte dos hóspedes, malgrado o subsequente estorno; (ii) a admissão de falha sistêmica (“bug”) pela ré em pelo menos um evento, o que teria obstado a defesa tempestiva, e (iii) o conteúdo das cláusulas contratuais destacadas (C.3 “d” e D.7 “d”), que, em tese, transferem integralmente às autoras os riscos da atividade de processamento e gestão antifraude, autorizando retenções/compensações unilaterais, cenário indicativo de desequilíbrio contratual e abusividade, consoante arts. 51, IV e §1º, III, do Código de Defesa do Consumidor e art. 122, do Código Civil.  Art. 51. São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que: (...) IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade; (...) § 1º Presume-se exagerada, entre outros casos, a vantagem que: (...) III - se mostra excessivamente onerosa para o consumidor, considerando-se a natureza e conteúdo do contrato, o interesse das partes e outras circunstâncias peculiares ao caso. Art. 122. São lícitas, em geral, todas as condições não contrárias à lei, à ordem pública ou aos bons costumes; entre as condições defesas se incluem as que privarem de todo efeito o negócio jurídico, ou o sujeitarem ao puro arbítrio de uma das partes. O periculum in mora, por sua vez, decorre do bloqueio/retenção de numerário significativo e do prazo dilatado (até 180 dias) para deliberação das emissoras de cartão de crédito nos 96 casos submetidos, o que estreita o capital de giro, compromete pagamentos a terceiros (proprietários) e desestabiliza a operação típica das autoras, que dependem do fluxo regular de recebimentos para manutenção de suas atividades. Tais elementos demonstram risco de dano atual e concreto, além de risco ao resultado útil do processo. Acentua-se, também, a reversibilidade da medida, por se tratar de valores em dinheiro e porquanto, ao final, caso prevaleça a tese da ré, será possível compensação/cobrança dos montantes (ou desconto em repasses futuros), de modo que a tutela pretendida não se mostra irreversível neste momento. Ressalta-se possibilidade de revisão/adequação desta tutela à vista de novos elementos trazidos pela ré em contestação, mormente quanto aos 96 casos sob análise das emissoras. Em face do que foi dito, defiro o pedido de tutela provisória de urgência para:  1.a) Determinar que a ré libere às autoras, no prazo de 48 horas, todos os valores atualmente bloqueados/retidos em sua plataforma/conta digital relativos aos 97 chargebacksnoticiados, até o limite de R$ 203.881,72 (duzentos e três mil oitocentos e oitenta e um reais e setenta e dois centavos), devendo comprovar nos autos, em 5 (cinco) dias, a efetiva liberação e o respectivo demonstrativo (identificando transação, data, imóvel e valor), sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (mil reais), em caso de descumprimento, até o limite de R$ 100.000,00 (cem mil reais), nos termos do que autorizam os arts. 297 e 537 do CPC. 1.b) Determinar que a ré se abstenha de efetuar novas retenções automáticas a título de “chargeback” sem prévia ciência e janela mínima de 5 (cinco) dias úteis para contraditório administrativo das autoras e sem documentação mínima indicativa de irregularidade/fraude a ser disponibilizada às autoras, descumprida a obrigação, sob pena de multa de R$ 1.000,00, por evento de retenção indevida. 2) Cite-se a parte ré conforme art. 246, caput, e §§1ª e 1º-A do CPC, conforme o caso, para, querendo, contestar o pedido no prazo de 15 (quinze) dias, dando-se-lhe ciência dos efeitos da revelia (art. 344 do CPC). 3) Por fim, por evidenciar a hipossuficiência técnica, jurídica e econômica do consumidor, defiro o pedido de inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC (processo 5049287-55.2025.8.24.0023/SC, evento 17, DESPADEC1). Alega a recorrente que: a) em caso de chargeback, sua função é notificar o lojista sobre a contestação e fornecer os meios para que ele apresente sua defesa, mas a decisão sobre o estorno é do banco emissor do cartão; b) no caso, as contestações foram em razão de fraude, pois os cartões utilizados para as reservas não pertenciam aos hóspedes; c) não houve retenção de valores pela agravante, mas sim "um débito em sua conta, imposto pelas emissoras dos cartões"; d) atua como intermediadora de pagamentos (gateway de pagamentos), que "oferece uma interface para processar transações", sendo sua responsabilidade restrita "a garantir o processamento estável e seguro da transação, o que foi feito"; e) nesse contexto, nem deveria figurar no polo passivo da demanda;  f) trata-se de uma relação empresarial, em que é inaplicável o CDC e incabível a inversão do ônus da prova com base nessa legislação; g) "a cláusula contratual que atribui ao lojista o risco por fraudes em transações 'sem cartão presente' é válida e reflete a realidade do mercado"; h) o risco de prejuízos com fraudes é inerente à atividade empresarial das agravadas, que "estão na ponta da relação comercial e possuem o dever de adotar as cautelas necessárias para mitigar tais riscos, especialmente em transações online, notórias por sua vulnerabilidade"; i) conforme admitido na petição inicial, as agravadas "não exigem documentos de identidade dos hóspedes no momento da reserva", falha que "é a causa direta do prejuízo, caracterizando a negligência que atrai para si a responsabilidade"; j) assim, "o prejuízo não decorreu de qualquer ato da Agravante, mas sim da própria negligência das Agravadas em um ambiente de alto risco, do qual tinha ciência e anuiu quando da assinatura do contrato com a Agravante"; k) os precedentes mencionados na decisão agravada "foram aplicados de forma descontextualizada"; l) a ocupação dos imóveis "não legitima a transação financeira", uma vez que "o chargeback não discute a prestação do serviço, mas sim a validade do pagamento"; e, m) ao determinar o desembolso, com recursos próprios, de R$ 203.881,72 (duzentos e três mil oitocentos e oitenta e um reais e setenta e dois centavos) "para cobrir um prejuízo causado por terceiros (fraudadores)", a decisão descapitaliza a Agravante "de forma abrupta e injusta, comprometendo sua própria operação, o pagamento de seus funcionários e fornecedores", de modo que o perigo de dano é invertido; o) além disso, há risco de irreversibilidade, já que "a probabilidade de reaver o montante das Agravadas – que já se declaram com o 'fluxo de caixa comprometido' – é mínima". Acrescenta que, em demonstração de sua boa-fé processual e a fim de eliminar qualquer risco às agravadas, realizará o depósito judicial do valor, para garantia do juízo. Requer, nesta ordem, a concessão de efeito suspensivo ao recurso e o seu provimento, com a consequente reforma da decisão impugnada (evento 1, INIC1). O pedido liminar foi deferido em parte para suspender a determinação de pagamento às agravadas do valor em discussão e de abstenção de novas retenções a título de chargeback, "devendo a quantia permanecer depositada em conta judicial até o julgamento do feito" (evento 10, DESPADEC1). Houve contraminuta (evento 19, CONTRAZ1). VOTO A questão afeta à ilegitimidade da parte recorrente não foi objeto da decisão agravada, o que obsta, neste momento processual, a sua análise, sob pena de supressão de instância e ofensa ao duplo grau de jurisdição. Por outro lado, a determinação de inversão do ônus da prova, com base no Código de Defesa do Consumidor, comporta censura, uma vez que a hipótese não contempla a aplicação da teoria finalista mitigada. Com efeito, conforme assinalado em judicioso precedente da relatoria do Desembargador Luiz Felipe Schuch, o qual versou igualmente sobre gestão de pagamento - chargeback, mudando o que deve ser mudado: Tocante à incidência do Código de Defesa do Consumidor, os conceitos definidores de consumidor e fornecedor estão assim expressos: Art. 2° Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final. Parágrafo único. Equipara-se a consumidor a coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo. Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista. Há duas correntes doutrinárias clássicas sobre a caracterização das relações de consumo: a) a finalista/subjetiva; e b) a maximalista/objetiva. A primeira, mais restritiva, possui como foco o caráter econômico da relação, estabelecendo que para ser consumidor não basta ser o destinatário final fático do produto, é necessário, ainda, ser o destinatário final econômico do bem, não o utilizando, por exemplo, para revenda ou fomento de suas próprias atividades econômicas. Nesse sentido, a doutrina ensina: O CDC regula situações em que haja "destinatário final" que adquire produto ou serviço para uso próprio sem finalidade de produção de outros produtos ou serviços; [...] o CDC não regula situações nas quais, apesar de se poder identificar um "destinatário final", o produto ou serviço é entregue com a finalidade específica de servir de "bem de produção" para outro produto ou serviço e via de regra não está colocado no mercado de consumo como bem de consumo, mas como de produção; o consumidor comum não o adquire (NUNES, Rizzatto. Curso de Direito do Consumidor. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2005). Os maximalistas, por outro lado, atribuem concepção abrangente ao conceito de consumidor, equiparando-o a todo aquele que adquirir produtos e serviços tanto para uso pessoal como profissional, pouco importando, neste sentido, se a pessoa é física, jurídica, vulnerável ou hipossuficiente. O Superior , rel. Luiz Felipe Schuch, Quinta Câmara de Direito Comercial, j. 31-07-2025 - grifou-se). Assim, embora seja considerada abusiva a cláusula que atribui ao lojista, em qualquer circunstância, a responsabilidade exclusiva em caso de chargeback, é admitida sua responsabilidade quando se verificar que sua conduta foi decisiva para a ocorrência da fraude.  Em razão disso, entendo, ao menos em juízo de cognição provisória e sumária, que a questão demanda uma análise mais aprofundada, possibilitando o exercício do contraditório e a produção de provas, para que sejam apuradas as circunstâncias em que se deu o cancelamento dos pagamentos por cartão.  Nesse contexto, a determinação de pagamento em favor da parte autora, em sede de tutela de urgência, não parece a medida mais adequada, uma vez que a probabilidade do direito não restou suficientemente comprovada nessa fase inicial do processo. Quanto ao perigo da demora, embora tenha sido alegado na petição inicial que os valores em questão "representam receitas fundamentais para a continuidade das operações da parte autora", não foi comprovado que o não recebimento imediato da quantia coloca em risco sua atividade empresarial.  Além disso, a parte ré/agravante já efetuou o depósito incidental do montante (eventos 32 e 33 dos autos de origem), de forma que resta garantido o pagamento em caso de procedência dos pedidos formulados na ação.  Por outro lado, há risco de irreversibilidade da medida de liberação do valor em favor das agravadas, o que deve ser evitado (art. 300, § 3º, CPC) (evento 10, DESPADEC1). Tais fundamentos, ainda que firmados em juízo de cognição sumária, seguem incólumes. Observa-se que o reconhecimento das supostas fraudes se deu na cadeia da operação dos cartões, por parte das instituições emissoras, de modo que a agravante não poderia, a rigor, repassar os valores concernentes às vendas contestadas. Nesse cenário, é imperativa a observância do contraditório e da ampla defesa, ambos já exercidos na origem, mediante a apresentação de contestação, não sendo cabível imputar à recorrente, desde logo, a responsabilidade por fatos alheios à sua atuação ou presumir a veracidade das alegações da parte adversa sem a devida instrução probatória. Ante o exposto, voto no sentido de dar provimento ao agravo de instrumento para revogar a tutela concedida e afastar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor à hipótese.   assinado por SORAYA NUNES LINS, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6980320v4 e do código CRC 65a5d470. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): SORAYA NUNES LINS Data e Hora: 14/11/2025, às 14:16:07     5075707-69.2025.8.24.0000 6980320 .V4 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:41:40. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Documento:6980321 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA Agravo de Instrumento Nº 5075707-69.2025.8.24.0000/SC RELATORA: Desembargadora SORAYA NUNES LINS EMENTA AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DECLARATÓRIA DE NULIDADE DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. DECISÃO QUE DEFERIU TUTELA DE URGÊNCIA E DETERMINOU A INVERSÃO DO ÔNUS DA PROVA COM FUNDAMENTO NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. INSURGÊNCIA DA INSTITUIÇÃO DE PAGAMENTO. RELAÇÃO ENTRE PESSOAS JURÍDICAS. SERVIÇO DE INTERMEDIAÇÃO DE PAGAMENTOS UTILIZADO COMO INSTRUMENTO DE FOMENTO À ATIVIDADE ECONÔMICA DAS AGRAVADAS. AUSÊNCIA DE DESTINAÇÃO FINAL DO SERVIÇO. INEXISTÊNCIA, ademais, DE HIPOSSUFICIÊNCIA TÉCNICA, JURÍDICA OU ECONÔMICA. INAPLICABILIDADE DO CDC. PRECEDENTES. CHARGEBACK. SUPOSTAS FRAUDES NA CADEIA DE OPERAÇÃO DOS CARTÕES, segundo as INSTITUIÇÕES EMISSORAS. AUSÊNCIA, NESTE MOMENTO PROCESSUAL, DE ELEMENTOS SUFICIENTES PARA IMPUTAR À AGRAVANTE QUALQUER RESPONSABILIDADE PELOS VALORES CONTESTADOS. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROBATÓRIA, COM OBSERVÂNCIA DO CONTRADITÓRIO E DA AMPLA DEFESA. PROVIMENTO. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 5ª Câmara de Direito Comercial do decidiu, por unanimidade, dar provimento ao agravo de instrumento para revogar a tutela concedida e afastar a aplicação do Código de Defesa do Consumidor à hipótese, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado. Florianópolis, 13 de novembro de 2025. assinado por SORAYA NUNES LINS, Desembargadora Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico https://2g.tjsc.jus.br//verifica.php, mediante o preenchimento do código verificador 6980321v4 e do código CRC 47ea4bc5. Informações adicionais da assinatura: Signatário (a): SORAYA NUNES LINS Data e Hora: 14/11/2025, às 14:16:07     5075707-69.2025.8.24.0000 6980321 .V4 Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:41:40. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO VIRTUAL - RESOLUÇÃO CNJ 591/24 DE 13/11/2025 A 21/11/2025 Agravo de Instrumento Nº 5075707-69.2025.8.24.0000/SC RELATORA: Desembargadora SORAYA NUNES LINS PRESIDENTE: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH PROCURADOR(A): BASILIO ELIAS DE CARO Certifico que este processo foi incluído como item 14 na Pauta da Sessão Virtual - Resolução CNJ 591/24, disponibilizada no DJEN de 24/10/2025, e julgado na sessão iniciada em 13/11/2025 às 00:00 e encerrada em 13/11/2025 às 15:33. Certifico que a 5ª Câmara de Direito Comercial, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão: A 5ª CÂMARA DE DIREITO COMERCIAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PROVIMENTO AO AGRAVO DE INSTRUMENTO PARA REVOGAR A TUTELA CONCEDIDA E AFASTAR A APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR À HIPÓTESE. RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora SORAYA NUNES LINS Votante: Desembargadora SORAYA NUNES LINS Votante: Desembargador LUIZ FELIPE SCHUCH Votante: Desembargador ROBERTO LEPPER Agaíde Zimmermann Secretário Conferência de autenticidade emitida em 16/11/2025 15:41:40. Identificações de pessoas físicas foram ocultadas